A referida região, que fica no Deserto Ica, ao sul da costa Peruana, é considerada uma formação Lagerstätte, designação paleontológica para um depósito sedimentar com extrema abundância de fósseis muito bem preservados. Neste local é possível encontrar uma diversidade de fósseis de tubarões e raias, tartarugas-marinhas, crocodilos, peixes, aves marinhas e principalmente, pinípedes e cetáceos que viveram durante o Mioceno.
Em 15 de Julho deste ano, um grupo multidisciplinar de pesquisadores publicou um estudo que reúne informações tafonômicas¹ a respeito de 890 fósseis de vertebrados marinhos encontrados ao sul da costa Peruana. Além da riqueza de exemplares, o que mais impressiona neste depósito fóssil é a preservação de tecidos moles, algo extremamente difícil de ocorrer, já que são os primeiros a se decompor após a morte do organismo. Outro fato que intrigou os pesquisadores foi a quantidade de fósseis “inteiros” encontrados. Quando um organismo morre, sua carcaça está sujeita a várias situações, como deslocamento e predação, que podem culminar na desarticulação de seus esqueletos antes do soterramento e posterior fossilização. Via de regra, é muito mais rotineiro serem encontrados apenas fragmentos de um animal em depósitos sedimentares, tornando o papel dos paleontólogos e tafonomistas muito mais complicado! Felizmente, não foi esse o caso para a maior parte dos fósseis encontrados da Formação de Pisco!
¹ Tafonomia se refere ao estudo dos processos que ocorreram após a morte de um organismo até a sua fossilização e posteriormente do soerguimento da camada de sedimento onde se encontra.
Dentre os vertebrados marinhos presentes nesta Formação, os cetáceos dominam, representando 85% dos 890 espécimes encontrados. Destes, a maior parte dos fósseis são pertencentes aos Mysticeti (baleias), Odontoceti (golfinhos) e apenas 7% representam os Pinípedes (focas, leões e lobos marinhos, morsas).
Algo interessante notado pelos pesquisadores é que os fósseis de baleias apresentaram um alto nível de articulação, enquanto que o oposto foi observado para os golfinhos e pinípedes. Algumas hipóteses elaboradas pelos pesquisadores para explicar esse fato incluem características específicas das baleias, como seu tamanho relativo maior e espessura do tegumento em conjunto com características da própria camada de sedimento onde elas foram encontradas, o diatomito, que é capaz de promover maior facilidade de soterramento, diminuindo consideravelmente as chances de deslocamento e flutuação da carcaça.
Um fator crucial para a fossilização, é o rápido soterramento do organismo após sua morte. A preservação de uma variedade de tecidos moles nessa formação, incluindo as barbas ("dentes") das baleias, pode ser explicado, principalmente, por esse fator. Resultados deste estudo foram capazes de mostrar que o soterramento rápido em águas-rasas foram resultado tanto do impacto do corpo do organismo com o substrato ao afundar - que por si só já se converte em um soterramento parcial - e do "auto enterramento" ocasionado pelas ondas e correntes que circulam e perturbam o substrato em volta da carcaça do animal, acelerando o processo de soterramento.
A abundância de fósseis nesse sítio paleontológico reflete o que um dia foi abundância de vida. Provavelmente a Bacia de Pisco foi um local de alimentação e reprodução desses grupos no final do Mioceno, aproximadamente 7 milhões de anos atrás. É o caso de cetáceos como Messapicetus e Brachydelphis e do tubarão Carcharhinus brachyurus cujos fósseis foram encontrados na Formação Pisco.
REFERÊNCIAS
Taphonomy of marine vertebrates of the Pisco Formation (Miocene, Peru): Insights into the origin of an outstanding Fossil-Lagerstätte
https://doi.org/10.1371/journal.pone.0254395
https://en.wikipedia.org/wiki/Lagerstätte
IMAGEM-BALEIA: https://view.genial.ly/60999f7fbe13b40d6758018a/presentation-endangered-animal-blue-whale
IMAGEM-ORCA https://aprenda.bio.br/zoologia/curiosidades-sobre-a-orca-caracteristicas-habitat-e-alimentacao/
IMAGEM-MORSA
https://www.infoescola.com/wp-content/uploads/2010/04/pinipedes-450x337.jpg
Num é? Eu adorei esse artigo e como sou apaixonada por cetáceos, fiquei morrendo de vontade de visitar esse local hahahaha muito impressionante mesmo
Que massa, seu texto, Duda! Nossa, realmente impressionante o potencial de preservação de algumas regiões, com o "casamento perfeito" de várias condições que permitiram acessarmos hoje um passado tão distante. Show demais!!