Mas que história é essa de dinossauro zumbi?
Antes de sair publicando em suas redes sociais que zumbis ou mortos-vivos existem como nas conhecidas séries e filmes da Cultura Pop, e piorar o susto ao espalhar que cientístas confirmaram que, há dezenas de milhões de anos, haviam dinossauros zumbis que vagavam sob o solo da crosta terrestre, vamos entender melhor o que seria esse "zumbissauro".
O trabalho que nos conta essa história, ainda em pre-print, sem dúvidas, é um feito extraordinário da Ciência brasileira, trazendo conhecimento nunca antes palpados pela academia. Além disso, demonstra como a prática cintífica é um processo árduo e que integra diversas áreas que contribuem para o entendimento da natureza sob a óptica da Ciência, ao explanar o corpo científico onde o todo é maior que a soma das partes.
Essa história começa há cerca de 80 milhões de anos, durante o período Cretáceo, no noroeste paulista, no qual um dinossauro saurópode de pequeno porte, da família dos titanossauros - aqueles dinossauros herbívoros e pescoçudos- já senil e que provavelmente sofria com dores imensuráveis, deparou-se com a morte. Milhões de anos se passaram e, no tempo presente, em 2017 a paleontóloga professora doutora Aline Ghilardi (DINOLAB-UFRN), ao estudar os fósseis da bacia Bauru, que hoje se encontram no laboratório de Paleoecologia e Paleoicnologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), percebeu um pequeno fóssil de fêmur de titanossauro que chamou sua atenção devido as características peculiares, tais como projeções esponjosas (indicadas pelos círculos na imagem ao lado), sobre a qual foi levantada a hipótese que se tratava de algum tipo de câncer no osso desse dinossauro.
Em 2018, o paleontólogo mestre Tito Aureliano (IGE-UNICAMP), deu sequência ao estudo desse fóssil tão curioso, no entanto sobre novas abordagens que não só as que limitam às análises aos aspectos morfológicos externos do fóssil. De modo a perceber a constituição micróscopica, histológica de tais projeções. Por meio de uma tomografia computadorizada realizada na Escola de Medicina da Universidade Estadual de São Paulo (USP), o paleontólogo, então, chegou ao diagnóstico de uma infecção óssea que pode causar deformações, a osteomielite aguda, que, ainda hoje, atinge humanos e outros animais.
A partir da tomografia, um modelo 3D do fóssio foi criado, de maneira a permitir a visualização da lesão como um todo, desde as partes mais internas às mais externas, estas vistas, pela primeira vez, por Aline. Diga-se de passagem, nenhuma representação desse tipo jamais havia sido criada na Academia, pelo menos nenhuma com essas especificidades.
Dito isso, considerando como essa doença age em organismos atuais, o saurópode provavelmente sofreu bastante até atingir o estado que, hoje, é observado, segundo o pesquisador, o aspecto se assemelha muito ao que poderia ser um dinossauro zumbi. Consoante aos dois estudiosos, a conformação histológica da patologia e o desenvolvimento microscópico não são devidamente conhecidos ainda, nem mesmo com os avanços da medicina moderna, por isso, preparam lâminas delgadas, ou seja, bem fininhas, do tecido fossilizado para que fossem estudados os detalhes da infecção. O resultado esclareceu como essa evoluiu até a formação dos caroços, perceberam, até mesmo, o momento em que a ferida se abriu e foi colonizada por bactérias. Esses detalhes são e continuarão sendo de extrema importância para medicina moderna, para, por exemplo, o tratamento dessa condição.
Ainda, notaram que o dinossauro era idoso no momento de morte, isso, entretanto, não é uma explicação razoável para a origem da infecção, em função disso, os dois pesquisadores começaram a buscar o motivo da doença, já que não haviam sinais de fraturas ou mordidas que poderiam ser estopins. A surpresa foi encontrada por Fresia Ricardi Branco, paleontóloga da UNICAMP, que, equanto analisava as amostras dos tecidos fossilizados, deparou-se com um microfóssil nos canais vasculares do osso do dinossauro, em seguida, com uma observação mais detalhada, Tito percebeu mais de dez microrganismos fossilizados.
Nesse momento, os pesquisadores convidaram a paleoparasitologista Carolina Nascimento (UFSCAR) para
analisar as amostras. Ela detectou mais de SE-TEN-TA microrganismos similares preservados dentro do osso do saurópode. Dessa forma, foi capaz de determinar, de maneira pioneira, que esses são algum tipo de parasita sanguíneo. Pasmem, também foi a primeira vez em que se encontrou parasitas preservados dentro de um osso de dinossauro. Uma análise geoquímica, então, indicou a fossilização desses microfósseis por um processo chamado de fosfatização.
A fossilização ocorreu de forma rápida, portanto, os corpos dos microrganismos foram preservados no hospedeiro antes que fossem degradados. Não foi possível, entretanto, determinar se os parasitas são os responsáveis pela infecção nos ossos, de todo modo, os pesquisadores continuam a investigar os mesmos. Essas análises devem ser, em breve, publicadas em trabalhos. Dito tudo isso, o ponto é: o saurópode não é exatamente um zumbi, mas os sintomas físicos da osteomielite grave que acomete o dino são muitos semelhas a tudo aquilo que um zumbi deveria carregar: as feridas abertas, o pus, as erupções, o sangue... tudo isso parece tão mórbido, doloroso e assustador, que não há outra saída: esse dinossauro poderia, facilmente, fazer uma participação especial em The Walking Dead, aquela série da Fox que não acaba nunca.
Referência
- Aureliano, T., Nascimento, C.S.I., Fernandes, M.A., Ricardi-Branco, F.,
Ghilardi, A.M., Blood parasites and acute osteomyelitis in a NON-AVIAN dinosaur (sauropoda,
titanosauria) from the upper cretaceous adamantina formation, bauru basin, southeast Brazil,
Cretaceous Research, https://doi.org/10.1016/j.cretres.2020.104672.
Show, Matheus! Que história! = P Só atualizando, esse artigo já está aceito e oficialmente publicado na revista Cretaceous Research ;)