Foi encontrado na República Dominicana, na Mina La Toca, entre as cidades de Puerto Plata e Santiago de los Cabalerros, um pedaço de âmbar que guardava a primeira evidência fóssil da associação entre um triatomíneo, Triatoma dominicana sp., popularmente conhecidos como barbeiro, e um tripanossomatídeo, Trypanosoma antiquus sp. possivelmente ancestral do Trypanosoma cruzi, o causador da doença de Chagas. No achado de cerca de 15 a 40 milhões de anos atrás, Eoceno-Oligoceno ou começo do Mioceno, estavam presentes diferentes artrópodes hematófagos, incluindo um barbeiro próximo a partículas fecais contendo os parasitos. Mas por que essa descoberta é tão importante?
Triatoma dominicana sp. encontrado no pedaço de âmbar, na República Dominicana,
Trypanosoma antiquus sp. na forma metacíclica, encontrado em partículas de fezes no pedaço de âmbar próximo ao triatomíneo.
A Doença de Chagas é uma doença endêmica da América Latina, causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi e é um problema de saúde pública afetando cerca afeta cerca de 6-8 milhões de pessoas no mundo todo. Uma das características muito marcantes desse parasito é sua capacidade de infectar diversos tipos de seres vivos, além de humanos ele também pode infectar diversos tipos de mamíferos e até aves. Porém nem sempre esse protozoário teve a capacidade de infectar tantos animais.
É hipotetizado que formas mais antigas de T. cruzi, eram mantidas em gambás , cerca de 65 milhões de anos atrás. Durante esse período os barbeiros ainda não existiam, então o parasito era transmitido a partir das glândulas anais dos gambás, penetrando na mucosa e chegando na circulação sanguínea. Nesse contexto os hospedeiros da parasitose se limitavam a gambás, mas o que possibilitou a sua diversificação característica?
Se você pensou nos barbeiros, você está totalmente correto. A associação da relação triatomíneo-barbeiro permitiu que o parasito “pulasse” para outros animais, e criasse um ciclo silvestre contínuo e amplo. O barbeiro se infecta quando pica um animal infectado, ingerindo junto com o sangue o parasita, no meio doméstico classicamente o seu humano é infectado por contato com as fezes desse barbeiro, mas no meio silvestre isso acontece majoritariamente quando durante o momento da picada o animal tenta revidar e acaba ingerindo o parasito se tornando infectado. Esse processo é um dos principais motivos pela ampla disseminação da doença na América Latina, assim como a dificuldade de erradicá-la, uma vez que é basicamente impossível remover o status de reservatório de animais silvestres infectados e impedir a circulação do parasito.
Assim, a descoberta desse fóssil em âmbar é fundamental, por que registra um momento em que a relação parasito-vetor já estava estabelecida, abrindo caminho para a diversificação dos hospedeiros de T. cruzi. Sem essa associação é bem possível que a doença permaneceria restrita a um grupo limitado de animais, sem se tornar um problema de saúde pública de proporção continental. Além disso, ele também representa como o estudo paleontológico também conversa com o estudo de questões da área da saúde, sendo importantes para entender como doenças atuais chegaram no status que se encontram no mundo atual.