Para desvendar os mistérios do comportamento de animais pré- históricos a partir de descobertas fósseis, frequentemente são usadas características indiretas. Um caso surpreendente surgiu no sítio Messel pit, na Alemanha, onde fósseis raros de tartarugas do gênero Allaeochelys foram encontrados num estado um tanto quanto íntimo: durante o acasalamento. Esta descoberta única abre uma janela de oportunidades para cientistas compreenderem o habitat, comportamento reprodutivo, dieta, estilo de vida e anatomia funcional dessas tartarugas.
O sítio fossilífero de Messel pit é o local mais rico do mundo para a compreensão do ambiente de vida do Eoceno, possuindo fósseis muito bem preservados. O local possui uma extensão de xisto betuminoso formado pela deposição de lama e
materiais orgânicos, que foi responsável pela formação de um ambiente anóxico. Várias hipóteses tentam explicar o porquê do local possuir uma riqueza de espécimes preservadas nos sedimentos do lago. A teoria mais aceita atualmente sugere que ocorreu emissão constante de gases vulcânicos , causando a morte de indivíduos que viviam dentro e ao redor do lago.
A partir de detalhes morfológicos foi possível distinguir o sexo masculino e feminino entre os indivíduos. Os machos, com caudas longas que se estendem além da carapaça, são relativamente menores em comparação com as fêmeas. As fêmeas, por outro lado, apresentam caudas mais curtas. As propriedades fisiológicas das tartarugas da espécie Allaeochelys crassesculpta não são muito bem conhecidas, mas se infere que a absorção de oxigênio se dava através da
pele, possibilitando maior tempo de submersão. Em contrapartida, sob condições de pouco oxigênio, o dióxido de carbono e toxinas também eram absorvidas. Diante disso, acredita-se que estas tartarugas começaram o acasalamento em águas superficiais, mas vieram a falecer à medida que se aprofundaram nas águas anóxicas.
Essa descoberta excepcional possibilita uma compreensão ecológica enorme a respeito do sítio fossilífero de Messel pit, destacando a importância de locais como este na preservação de momentos únicos da vida pré-histórica.
Figura 1. Macho (à direita) é cerca de 20% menor que a fêmea e pode ser reconhecido pela cauda relativamente mais longa e pela falta de cinesia plastral.
Referências: Joyce, W. G., Micklich, N., Schaal, S. F., & Scheyer, T. M. (2012). Caught in the act: the first record of copulating fossil vertebrates. Biology letters, 8(5), 846–848. https://doi.org/10.1098/rsbl.2012.0361