top of page
Foto do escritorRichard Campos

O que são acidentes ofídicos e quais as suas consequências?

Atualizado: 13 de mar. de 2023

Já ouviu falar no termo “acidentes ofídicos”? O termo em questão está relacionado ao encontro entre seres humanos (ou animais domésticos) e serpentes, onde há a ocorrência de picada. As picadas por serpentes conhecidas como "peçonhentas" podem gerar danos aos tecidos, como os músculos, e até mesmo ao sistema nervoso. Entretanto, há tratamentos que visam a redução das sequelas. Leia o texto e saiba quais são!

Você já pensou em produzir conteúdo para Internet? Escrevemos um E-book 100% gratuito com diversas ferramentas perfeitas para isso. Aproveite!


Quer ir para alguma parte específica deste artigo? Basta clicar em qualquer um dos tópicos:


O que são acidentes ofídicos?


Os acidentes ofídicos são os envenenamentos causados pela inoculação (inocular = injetar) de toxinas presentes nos peçonhas das serpentes. O acidente se dá por meio da picada de cobras, que podem gerar danos teciduais, musculares e até sistemáticos (atingindo o sistema nervoso do acidentado).


Mas, antes de mais nada, é importante entendermos qual a diferença entre animal peçonhento e animal venenoso.


Diferença entre animal venenoso e peçonhento


Animal peçonhento: é classificado como animal peçonhento aqueles que produzem/possuem toxinas e que são capazes de inocular essa toxina através de um aparato especializado, como as presas das serpentes, os ferrões dos escorpiões ou as quelíceras das aranhas. Nesses casos, o veneno é chamado de peçonha.


Animal venenoso: são considerados venenosos os animais que também produzem ou possuem toxinas mas que não são capazes de injetar o veneno, por não possuírem um aparelho inoculador, como: anfíbios (sapos, rãs e pererecas), peixe baiacu, entre outros.


As serpentes utilizam a peçonha para a caça de alimento e na defesa contra predadores. A peçonha também possui papel fundamental no início da digestão dos alimentos, por conter diversas proteínas, enzimas e aminoácidos, além de colaborar com a deglutição.


Você sabia que o veneno das serpentes é a matéria prima para a produção de medicamentos? Leia o nosso texto: Quais são os remédios feitos com veneno de cobra?


Os acidentes ofídicos são facilitados por diversos fatores, alguns deles são os acúmulos de resíduos sólidos, entulhos, vegetação alta em terrenos, entre outros. Essas situações atraem roedores que buscam por abrigo e alimento nestes locais, o que por consequência, atrai as serpentes.


É comum a ocorrência de acidentes com trabalhadores do campo, uma vez que trabalham em plantações e locais em que a vegetação é alta, e onde as serpentes costumam transitar.


Fizemos um kit de slides gratuito para você, que deixará suas aulas ainda mais interessantes. Aproveite!


Quais serpentes causam os acidentes ofídicos no Brasil?


O Brasil é um dos países mais biodiversos do mundo, ocupando a terceira posição no ranking mundial de variedade de espécies. Partindo da premissa de que existe rica biodiversidade no Brasil, parte dela é representada por animais peçonhentos como aranhas, escorpiões e elas, as serpentes. As espécies de serpentes que mais causam acidentes ofídicos no país pertencem à duas famílias: Viperidae, conhecidas como víboras, entre elas encontram-se as Jararacas, Surucucus e Cascavéis; e Elapidae, família que engloba as cobras corais-verdadeiras.


Cada gênero de serpente causa um determinado tipo de acidente e cada um deles apresentam sinais e sintomas diferentes entre si, sendo assim necessários tratamentos específicos. Os acidentes ofídicos são divididos em:


  • Acidentes botrópicos: acidentes causados por serpentes do gênero Bothrops, popularmente conhecidas como Jararacas. São elas as causadoras da maior porcentagem de acidentes registradas no Brasil, em torno de 86%;



Jararaca (Bothrops jararaca). Fonte: Wikimedia Commons/Renato Augusto Martins


  • Acidentes crotálicos: esses acidentes são causados pelas serpentes do gênero Crotalus, as conhecidas cascavéis ou serpentes das 4 (quatro ventas) - termo que se refere às quatro aberturas em seu focinho: 2 narinas e 2 fossetas loreais. Os cascavéis são responsáveis por cerca de 9% dos acidentes ofídicos no país.


As fossetas loreais são órgãos sensoriais localizados entre os olhos e as narinas, que permitem às serpentes identificar suas presas;



Cascavel (Crotalus durissus). Fonte: Wikimedia Commons/Renato Augusto Martins


  • Acidentes laquéticos: esses acidentes são provocados pela serpente Lachesis muta, a famosa surucucu-pico-de-jaca, a maior serpente peçonhenta das Américas e o maior Viperídeo do mundo, podendo atingir mais de 3 m de comprimento. Seu nome deriva das suas escamas que remetem a textura da casca de uma jaca. A surucucu é responsável por cerca de 4% dos acidentes;



Surucucu-pico-de-jaca (Lachesis muta). Fonte: Instituto Butantan.


  • Acidentes elapídicos: Essa classe de acidentes é provocada por serpentes do gênero Micrurus, e abrange as serpentes conhecidas como corais-verdadeiras. São responsáveis pela menor parcela dos acidentes ofídicos no Brasil, por conta de seus hábitos fossoriais (ficam embaixo do folhiço) e discretos, contabilizando cerca de 1%.


Coral-verdadeira (Micrurus corallinus). Fonte: Wikimedia Commons/Ricardo J. Sawaya.



Mais informações sobre os acidentes ofídicos podem ser encontradas no site do SINAN, Sistema de Informação de Agravos de Notificação.


Sintomas dos diferentes tipos de acidentes ofídicos


Para que a gravidade do quadro de envenenamento não evolua, é necessário realizar um diagnóstico preciso, para então poder escolher o tratamento mais adequado.

A sintomatologia (conjunto de sintomas) dos acidentes ofídicos em grande parte dos casos já é o suficiente para que o médico identifique o tratamento adequado, pois cada veneno age de maneira específica.


Em alguns casos os sintomas do envenenamento podem ser parecidos, como nos acidentes envolvendo os gêneros Lachesis e Bothrops, descritos abaixo.


Os sintomas que podem ser desencadeados pelos acidentes ofídicos são:


  • Acidente Botrópico (Bothrops): nos acidentes causados pelas Jararacas a vítima sentirá dor no local e poderá evoluir para um edema (inchaço) no local da picada que, em casos mais graves, poderá se estender. Por exemplo, se a picada foi sofrida na mão, o edema permanecerá ali, podendo se estender até o cotovelo em casos moderados e até o ombro em casos graves.


Poderá apresentar coagulopatia, ou seja, o tempo de coagulação sanguínea fica mais lento, o que pode ser evidenciado em teste de laboratório. Pode apresentar sangramento no local da picada (efeito hemorrágico), ou na gengiva e poros. E necrose (morte dos tecidos) que, se não tratada, pode levar a perda do membro.


Por fim, em casos severos o paciente pode apresentar insuficiência renal (os rins perdem a capacidade de realizar suas funções básicas) que é uma das causas principais de óbitos nos acidentes ofídicos causados pelas Jararacas.


  • Acidente Laquético (Lachesis): no acidente com a Surucucu-pico-de-jaca os sintomas são semelhantes aos observados no acidente com as jararacas, quanto às dores, edemas, hemorragia, possibilidade de necrose.


Esse tipo de acidente se diferencia do envenenamento botrópico por conta dos efeitos sistêmicos como, por exemplo: hipotensão (queda da pressão arterial); bradicardia (diminuição do ritmo cardíaco); náuseas, vômitos, cólicas abdominais.

Vale lembrar que nem todos esses sintomas diferentes estarão presentes, o que pode dificultar o diagnóstico.


  • Acidente Crotálico (Crotalus): no acidente com a Cascavel os sintomas são neurotóxicos (envenenamento do sistema nervoso). Esse tipo de envenenamento provoca ptose palpebral (dificuldade de manter os olhos abertos, pálpebras tendem a fechar involuntariamente), dificuldade respiratória e insuficiência respiratória em casos mais graves.


A miotoxina (ação miotóxica) vai agir nas fibras musculares causando lesões e dores musculares. Haverá o processo de rabdomiólise, processo no qual há a degradação da mioglobina presente nas fibras musculares.


Posteriormente, essa mioglobina é excretada pela urina, causando o escurecimento do líquido e resultando na chamada “urina cor de coca-cola”. Além disso, também pode ocorrer a alteração do tempo de coagulação sanguínea.


  • Acidente Elapídico (Micrurus): os acidentes com as corais-verdadeiras são, em maioria, considerados graves, visto que sua ação é neurotóxica, ou seja, atingem o sistema nervoso central. Os sintomas incluem a ptose palpebral (dificuldade de manter os olhos abertos), diplopia ou visão dupla, escurecimento das vistas, dificuldade de deglutição (de engolir), dificuldade respiratória que pode evoluir para insuficiência respiratória em casos mais graves.


Mas, qual dessas cobras é a mais perigosa? Entre os tipos de acidentes ofídicos citados os mais comuns são com as Jararacas, pois habitam localidades próximas às áreas urbanas tornando o encontro com seres humanos mais frequentes.


Esse fato torna as jararacas as mais perigosas. Mas vale ressaltar que o perigo aqui não está ligado à toxina mais potente, e sim a maior probabilidade de ocorrer o acidente, ou seja, é mais provável acontecer um acidente ofídico com uma jararaca do que com uma coral-verdadeira (que possui a toxina mais potente entre as serpentes brasileiras).


Descobrimos que as jararacas são as mais perigosas, mas qual é a serpente com a toxina mais potente e por quê? Neste caso, a toxina mais potente pertence à coral-verdadeira.


Seu veneno possui baixo peso molecular, ou seja, circula com maior facilidade pela corrente sanguínea e é responsável por acometer o sistema nervoso central, interrompendo as trocas de informações entre os neurônios.


Esta ação pode resultar na perda do controle dos músculos, causando a ptose palpebral, dificuldade de beber água ou algum líquido, e nos casos mais graves gerando insuficiência respiratória.


Tratamentos para acidentes ofídicos


Sabendo que os venenos são compostos por inúmeras toxinas, que compreendem a uma mistura de aminoácidos, enzimas, proteínas entre outras substâncias, como é possível definir o tratamento mais adequado?


Vamos lá! Para cada tipo de acidente ofídico existe um soro antiofídico específico que atua minimizando e revertendo a ação da peçonha injetada na vítima. Vale ressaltar que o tratamento com soro é o correto e eficaz contra picadas de serpentes peçonhentas.


Em casos de acidentes botrópicos (jararacas) utiliza-se preferencialmente o soro Anti-Botrópico, nos acidentes elapídicos (corais - verdadeiras) utiliza-se o soro Anti-Elapídico e para os acidentes crotálicos (cascavel) é utilizado é soro Anti-Crotálico. Esses são os soros específicos e utilizados quando a equipe médica possui clareza do diagnóstico e sabe qual foi a serpente responsável pela picada. Para os acidentes com a Surucucu já não é utilizado o soro específico, chamado Anti-Laquético, atualmente utiliza-se o soro Anti-Botrópico-Laquético.


Existem ainda casos em que os sintomas são semelhantes e utilizam-se uma combinação dos soros, por exemplo, em casos de envenenamento por jararaca e surucucu o paciente pode apresentar edemas, dores locais, hemorragias, necrose e sangramento no local da picada, diante da semelhança dos sintomas e da ausência de precisão no laudo pode-se utilizar o soro Anti-Botrópico-Laquético.


Da mesma forma, em casos de dúvidas no diagnóstico nos acidentes entre jararaca e cascavel, utiliza-se o soro Anti-Botrópico-Crotálico.


O que não fazer em casos de acidentes ofídicos


Já que estamos falando do que fazer e como tratar, vale a pena algumas dicas do que NÃO fazer em casos de acidentes ofídicos:


  • Não fazer torniquete: os torniquetes não impedem o veneno de seguir pela corrente sanguínea, uma vez picado, a peçonha já está em circulação, além de concentrar a toxina em uma determinada área e fazer com que o soro tenha dificuldade a chegar e reverter o quadro de envenenamento. O torniquete é um dos principais responsáveis pela necrose e perda do membro atingido;


  • Não cortar o local da picada: lembre-se que algumas dessas serpentes alteram a coagulação sanguínea, além de que pode contribuir com o risco de infecções secundárias;


  • Não fazer sucção “sugar” o veneno: uma vez ocorrido o acidente as toxinas já estão em circulação pela corrente sanguínea, a tentativa de sucção não reverte esse quadro e pode causar o aumento do risco de infecções;


  • Não é necessário levar a serpente para o hospital, se for possível tire uma foto. Mas o quadro clínico vai apontar a responsável pelo acidente;


  • O ideal é tranquilizar a vítima e levá-la o mais rápido possível ao hospital, o soro antiofídico tomado em pouco tempo após o acidente aumenta muito a chance de recuperação do paciente e a reversão do quadro de envenenamento.


Vale salientar que anualmente são registrados menos de 150 óbitos ocasionados por acidentes ofídicos, principalmente por conta da pronta administração do soro antiofídico que diminui o risco de agravamento dos quadros clínicos.


Os seres humanos não fazem parte da cadeia alimentar das serpentes e elas não têm interesse algum em gastar as suas toxinas neste encontro pois, como dito anteriormente, elas o utilizam para conseguir alimento e se proteger.


Além do mais, quando suas glândulas de veneno são ativadas são necessários alguns dias até que se encham novamente, fazendo com que elas tenham dificuldades em conseguir alimentos. Sendo assim, não é interessante para as serpentes gastarem suas toxinas com algo de que não irão se alimentar.


Entender os conceitos dentro da biologia são muito importantes para os alunos. Confira nosso glossário COMPLETO da biologia com centenas de termos.


Para você professor


Para auxiliar você professor a planejar sua aula, damos exemplos de experimentos relacionados a decomposição e habilidades que podem ser desenvolvidas com seus alunos com base na BNCC (Base Nacional Comum Curricular), a partir do uso deste texto como material de apoio.


(EM13CNT203) Avaliar e prever efeitos de intervenções nos ecossistemas, e seus impactos nos seres vivos e no corpo humano, com base nos mecanismos de manutenção da vida, nos ciclos da matéria e nas transformações e transferências de energia, utilizando representações e simulações sobre tais fatores, com ou sem o uso de dispositivos e aplicativos digitais (como softwares de simulação e de realidade virtual, entre outros).


(EM13CNT206) Discutir a importância da preservação e conservação da biodiversidade, considerando parâmetros qualitativos e quantitativos, e avaliar os efeitos da ação humana e das políticas ambientais para a garantia da sustentabilidade do planeta.


A fim de complementar as informações descritas no texto, deixo também a sugestão deste vídeo. Um curso ministrado pelo Prof. Dr. Paulo Bernarde, pesquisador e referência na área de acidentes ofídicos e etnoherpetologia (que é o estudo entre a ciência que estuda os répteis e anfíbios e sua ligação com a sociedade).





Quer saber sobre meio ambiente? Não deixe de conferir nosso Instagram e ler outros de nossos textos:




Escrito por: Richard Campos Rangel

Revisado por: Nicolas Nathan dos Santos



Como citar este texto: RANGEL, R. C.; SANTOS, N. N. O que são acidentes ofídicos e quais as suas consequências? Potencial Biótico. Disponível em: <https://www.potencialbiotico.com/post/acidentesofidicos>

Acesso em:


Referências bibliográficas:


MATOS, R. R.; IGNOTTI, E. Incidência de acidentes ofídicos por gêneros de serpentes nos biomas brasileiros. Ciência & Saúde Coletiva, v. 25, p. 2837-2846, 2020.



MOTA DA SILVA, A.; BERNARDE, P. S.; CARLOS DE ABREU, L. Acidentes com animais peçonhentos no Brasil por sexo e idade. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano, v. 25, n. 1, 2015.


SECRETARIA DE SAÚDE DO PARANÁ. Acidentes por serpentes. Disponível em: <https://www.saude.pr.gov.br/Pagina/Acidentes-por-Serpentes>. Acesso em: 08/02/2023.


VAZ, V. H. S.; BRAZIL, O. A. V.; PAIXÃO, A. E. A. Propriedade intelectual do soro antiofídico: a efetividade a partir da correlação entre os investimentos do governo federal nos principais institutos responsáveis pela produção do soro e realização de pesquisas para o tratamento de acidentes ofídicos no Brasil, com relação ao número de vítimas fatais dos acidentes. Cadernos Saúde Coletiva, v. 28, p. 409-421, 2020.





281 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page